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"Trivialidades" #3- Ronaldo e Messi: A pergunta que ninguém quer calar

Estreada a 02 de novembro de 2022, "Trivialidades" é uma rubrica mensal onde se discutem os mais diversos temas da sociedade. Artur Raposo assina este espaço.

Em 1991, Oliver Stone lançou JFK, filme que no país irmão, Brasil, foi denominado de “A pergunta que não quer calar”. A trama, tal como as iniciais do título da película indicam, era acerca do Presidente John Fitzgerald Kennedy, assassinado em 1963, num contexto que, ainda hoje, é suscetível a múltiplas teorias da conspiração envolvendo, algumas delas, o próprio governo norte-americano. Não querendo equiparar estas duas situações portadoras de um carácter distinto - a disputa futebolística entre dois jogadores de topo e um assassinato político, a morte de um ser humano, que originou tensões infinitas -, conseguimos perceber que se tratam de discussões intemporais.

Provavelmente, esta discussão durará muito para além desta consideração que elaboro em “trivialidades”, sendo esta mais uma entre tantas outras que lemos na internet ou assistimos na televisão, seja em canal generalista ou no cabo. Tivemos Frazier com Ali, Agassi e Pete Sampras, Senna e Prost, Jordan com todo o mundo, sendo que no futebol nunca se viveu uma rivalidade desta natureza; Pelé e Maradona não coincidiram, Zidane e Ronaldo são mais lembrados pelo o que fizeram juntos, em Madrid, do que um contra o outro, “A tomada da bastilha” do futebol francês que derrotou a canarinha, em 1998, no mundial realizado em terras gaulesas.

A digitalização do planeta permite que a discussão ocorra de forma colossal.
Tanto nas plataformas já referidas, como nas inúmeras páginas de milhares de fãs devotos que observamos no Facebook ou Instagram, como até no palco de guerra tecnológico que se tornou o Twitter. Messi e Ronaldo dividem adeptos do desporto, amigos, familiares e até nações.

No país vizinho, os duelos vivenciados pelos dois, na altura expoentes máximos de duas equipas com de um talento megalómano, Real Madrid e Barcelona, ganhou, com o passar do tempo, contornos mitológicos. Era um confronto que ia para além do desporto-rei. Um argentino e um português dariam um caráter internacional a uma disputa que dava voz a fantasmas ainda bem presentes numa sociedade espanhola que, afincadamente, tenta abranger as múltiplas culturas que constituem o seu estado.

Imagem por Kaique Bucci | D.R.
 
A capital, associada ao poder monárquico, e a Catalunha que, por sua vez, está associada à resistência republicana que tinham como fator de eclosão o nacionalismo catalão. Estas duas ideias opostas, no campo político, têm um precursor no campo futebolístico.

Neste sentido, podemos considerar Cristiano Ronaldo como a epítome do atleta moderno, talvez o “primeiro” da história que divide as águas, no plano desportivo, ao contrapor com Lionel Messi, que é, na sua génese, o futebol clássico no seu estado mais puro. Ronaldo é o produto de um desporto tecnológico e pragmático, focado nos resultados; o alcance do que, até então, consideramos inimaginável. A transformação do menino da classe pobre. Messi, noutra instância, traz consigo a periferia latina, a irreverência do futebol de rua, da bola que deambula pela urbe até ao entardecer. Se comparar ambos torna-se um exercício complexo, tentador para os milhões de treinadores de bancada ao redor do globo, entusiastas pelas estatísticas, nostálgicos e curiosos, a resposta objetiva, tornar-se-á, então, utópica.

O apelo a que se desfrute dos dois atletas, não se deve apenas a um cessar-fogo da discussão cultural, como também ao aspecto racional envolvente. A dúvida só permanece pela maior nuance que ambos os jogadores partilham um com o outro: a consistência. Um fulgor que não se extingue; vai para além dos golos, das assistências, da jogada que não se esquece. Uma ambição contínua, brio e profissionalismo que influenciam as massas. Mesmo aqueles que não ousam dar um chuto numa bola.

Por: Artur Raposo


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